O problema não está no estômago, está na mente


To de dieta! Comecei um programa de reeducação alimentar. To fazendo uma desintoxicação incrível! Consultei-me na ayurveda. Acho que vou me tornar vegana... Entrei na dieta paleo. Não importa o tipo, quando vivemos um processo de aprendizagem alimentar passamos a compreender coisas desse universo que antes nem cogitávamos pensar. Apenas sentávamos na mesa e nos segurávamos para não comer o pé dela como sobremesa. Agora, temos que aprender um mundo de novidades que dependem, é claro, da linha alimentar que optamos seguir. Coisas como: contar as calorias dos alimentos ou saber fazer combinações nutritivas de acordo com cada refeição. Programar o dia para comer de 3 em 3 horas. Ir a feira semanalmente. Incluir elementos funcionais, orgânicos e desintoxicantes no cardápio. Aprender a montar um prato saudável. Arriscar umas queimaduras no fogão. Ler rótulos. Tabelas. Listas. Contagens. Preparar nossas marmitas e refeições. De repente, a alimentação se torna um planejamento. 



O "Planejamento Alimentar" é fundamental para termos uma reorganização dos nossos hábitos - horários fixos, quantidades delimitadas, combinações pré-estabelecidas - com o intuito de reaprendermos a comer. É como se nossa rotina alimentar fosse um projeto que precisa ser rascunhado e visualizado para poder ser ressignificado.  Porque a maioria de nós - ocidentais globalizados - não sabe comer. Parece-me, portanto, que nada melhor que uma didática básica para isso acontecer com eficiência.

Sendo assim, por um lado, expandimos os conhecimentos alimentares e iniciamos o processo de organização de nosso cotidiano, a fim de mudá-lo, o que é ótimo. Entramos na lógica: você é o que você come. Afinal, ao menos 5 vezes por dia temos que parar para pensar: o que vou comer? São ínúmeras escolhas. Basta ter uma renda mensal simples e viver numa cidade com um supermercado (um dos super heróis da alimentação contemporânea, é uma pena que fast food não tenha a palavra super como prefixo também) e é muito fácil se perder no meio das prateleiras de opções. Mas na reeducação devemos saber o que escolher. Temos que ativar nosso foco a fim de filtrar o que vai nos fazer bem de acordo com nossos objetivos, sejam eles perder peso, ganhar massa magra, diminuir o colesterol, perder gordura corporal ou simplesmente ter uma dieta equilibrada. Não adianta nada jogar automaticamente no carrinho um Hot Pocket e dois miojos sabor Legumes. Dessa forma, nos tornamos super heróis diários.


No entanto, por outro lado, isso pode se tornar uma tortura. Primeiro porque realmente é difícil focar. Então, toda vez que acontece um deslize tipo: estou numa dieta de emagrecimento e comi uma panela de brigadeiro - ooops - assistindo o jogo do Brasil contra o Chile tenho vontade de me matar, nunca mais sair de casa e amaldiçôo 3938120938103 milhões de vezes o planejamento alimentar dado pela minha nutricionista. Ou então para compensar tenho a incrível idéia de ir à academia e correr 20 km sem parar 12 por hora para queimar tudo de uma vez (aqui, um parênteses: culpa é um sentimento tão desnecessário!). Segundo, há um momento no processo de reeducação que o negócio fica muito planejado e sistematizado, porque você atinge um nível muito bom de rigorosidade, controle e organização. Surge aí outra problemática: grandes chances disso se tornar uma noia. Afinal, tudo que você come pode ser tóxico demais ou calórico demais ou meu deus tem carne vermelha ali. A cada pedaço de brownie que entra na minha boca sou capaz de, num raio X invisível, contar as calorias que estou ingerindo.O super-herói se transforma num ser fanático que busca a sobrevivência no império dos industrializados. Comer se torna um ato de desespero. 



Quem faz ou já fez uma dieta sabe do que eu estou falando, episódios semelhantes a esses que descrevi pipocam por ai - e existem muito mais. Inúmeras variáveis de como-me-sentir-sob-pressão-numa-reeducação-alimentar. Talvez seja a ansiedade. Querer ter um resultado para ontem. Talvez seja a cobrança de fazer tudo com perfeição. Pode ser o desleixo de deixar para amanhã o que se pode começar hoje. Ok. Nosso cérebro nos prega diversas peças e quando estamos modificando totalmente nossos hábitos alimentares ele deve ficar muito louco e irritado por ter que sair da zona de conforto. 

Considero, portanto, super normal essas sensações. Mas não acho justo que A NOIA persista e que não superemos as mesmas. Porque comer deve ser um ato prazeroso e nossa boca não é uma calculadora de calorias ambulante. Além disso, nosso corpo não precisa ser de miss Brasil 2015. É possível fazer dieta sem estar de dieta? E ainda, é possível manter a dieta sem se tornar um super herói alimentar muito louco e fissurado na leitura de rótulos?


Numa de suas entrevistas quando Ministro da Cultura, Gilberto Gil falou que a cultura não é a cereja do bolo das políticas. Acredito que, da mesma forma, a alimentação não pode ser vista como a cereja do bolo da vida diária, é o recheio. É o que nos preenche, nos dá energia e nos estimula a viver. Mas como sempre, muito provável que a realidade esteja nos envolvendo numa pegadinha. O que precisamos focar, para além do prato a nossa frente, desse bolo gigantesco coberto de cereja, calda de caramelo e recheio de morango com chocolate, é no que se encontra dentro das nossas cabeças. Porque é a mente que projeta culpa, sofrimento, pressão e cobrança de uma maneira nada saudável. Não nosso estômago. De que adianta ter uma alimentação linda, regrada e colorida se a nossa relação mental não é saudável? Quando as sensações noiantes aparecerem, busquemos ter consciência que nossa mente está nos provocando e aceitemos suas pegadinhas sem nos torturarmos. Diz a lenda que ela -a mente- não vai saber o que fazer e vai fluir naturalmente. 



O problema não está nas nossas gorduras abdominais, no nosso colesterol alto, na nossa gastrite, no nosso estômago. Está dentro das nossas cabeças! A continuação para essa reflexão é: qual o problema afinal? Existe um problema de fato ou na verdade está tudo bem?

Beijos da Ju

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